Diferentemente de Roberto Carlos, não tenho o costume de preparar um especial de natal para os meus fãs. Até porque eu não tenho fãs. Porém, para não deixá-los sozinhos nessa noite de natal, vou relembrar um breve momento de derrota natalina do jovem e pueril Rafa Barbosa.
Era o natal de 1998 e naquele ano eu queria muito, muito mesmo, um “Futebol Gulliver”. Sempre fui adepto do futebol de botão, mas queria inovar e adquiri habilidade em outra categoria do esporte bretão. Portanto, passei o ano todo implorando para os meus pais, tios e padrinhos por esse brinquedo.
Eu estava passando por uma fase um pouco conturbada. No ano anterior, eu deixei de ser o pequeno príncipe da família, já que a minha prima (filha da minha madrinha e neta da minha tia mais legal e generosa) havia nascido. De repente, todas as atenções, mimos e presentes da família Barbosa estavam voltados para outra pessoa. Até eu, vez ou outra, me flagrava fazendo carinho e brincando com a garota que usurpou a minha condição de favorito do império Barbosa.
Mas eu tinha esperança de que o natal traria o meu tão esperado Futebol Gulliver.
Na grande noite, a família toda estava reunida na casa da minha tia. Quando cheguei, dei aquela sondada básica na árvore de natal e constatei que havia um pacote embrulhado com tema “infanto-juvenil” e no formato exato do balde que continha o kit de dois times Gulliver.
Senti que havia ganhado a noite naquele momento. Não precisava de mais nada. O Bom Velhinho seria generoso e na manhã do dia 25 eu estaria jogando e detonando os meus amiguinhos em mais uma categoria futebolística (já fazia isso no futebol da vida real, no vídeo-game, no futebol de botão e até no futebol de pregos e moeda).
Contei cada segundo entre a hora que cheguei e a hora da abertura dos presentes. Finalmente, depois de muita comida e papo furado fomos para a árvore de natal.
Sem nenhuma surpresa, os 10 ou 20 primeiros presentes foram todos para a minha priminha. Bonecas, bonecas, roupinhas, bonecas, bonecas, roupinhas, bonecas, tecladinhos com som de animais, roupinhas, bonecas e mais bonecas. Depois de uma breve pausa, um par de meias para o Rafael. Mais brinquedos para a minha prima. Uma cueca para o Rafael. Mais brinquedinhos para a minha prima e uma blusa para o Rafael.
O pacote que parecia o balde Gulliver ainda estava ali e era questão de tempo até alguém pegar e falar o meu nome. Um momento clássico de vitória e uma daquelas histórias de milagre natalino.
Minha tia pegou o embrulho, olhou pra mim com uma cara de “esse é o seu grande momento, Rafael. Venha brilhar com o seu mais novo e completo kit de futebol Gulliver, contendo o pano gramado e 22 jogadores de Cruzeiro e Atlético. Vem ser feliz nesse natal”.
Infelizmente, as palavras não foram bem essas, mas sim:
– Ih, gente! Mais um presente para a Ana Luiza! Essa neném tá demais!
Decepção. Tristeza. Ambos os sentimentos na sua forma mais profunda. Não entendi o que havia feito de errado naquele natal. O que até alguns minutos atrás era o meu presente mais esperado, de repente havia se tornado um balde com uma espécie de LEGO gigante, já que uma criança de 1 ano e alguns meses não poderia brincar com os pequenos cubinhos de montar.
Daquele dia em diante me tornei uma pessoa amarga, que não acreditava mais no natal e nesse espírito que acompanha a data. Passei a ser mais rabugento e jurei não mais comparecer às festas de fim de ano da minha família.
Felizmente eu tinha apenas 12 anos e no natal seguinte já estava lá esperando pelo meu presente.
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